Expandir ou Focar no Core Business?
Afirmar que uma empresa deve definir claramente sua estratégia e executá-la com perfeição é uma obviedade, mas colocar isso em prática não é tão simples como parece. Sua empresa está preparada?
Recentemente, a Sodexo, uma das maiores empresas globais de serviços de Facilities, anunciou um movimento estratégico de simplificação de seus negócios, conforme relatado pelo Valor Econômico em 23 de setembro de 2024 (Sodexo simplifica operações…). A grande multinacional separou suas operações de benefícios corporativos, como vale-alimentação, vale-refeição e cartões multibenefícios, para focar no seu core business: serviços de alimentação e gestão de Facilities. Esse foco mais restrito tem acelerado o crescimento da empresa, que agora investe em soluções inovadoras, como micromercados autônomos e expansão de suas operações de Facilities, além de considerar potenciais fusões e aquisições. O Brasil, sendo um dos principais mercados da empresa, tem contribuído significativamente para essa trajetória de crescimento.
Esse exemplo recente da Sodexo demonstra que, mesmo para grandes players globais, a simplificação e o foco no core business podem ser estratégias poderosas para impulsionar o crescimento. No dinâmico mercado de gestão de Facilities, executivos de alto nível enfrentam essa mesma decisão: expandir as operações ou concentrar-se no core business para maximizar a excelência operacional.
Introdução – Contexto Brasileiro
A terceirização dos serviços de Facilities no Brasil, inicialmente focada na década de 1990 em serviços básicos como limpeza, segurança e manutenção predial, evoluiu significativamente ao longo dos anos para incorporar uma gama mais ampla e complexa de serviços. Esta expansão inclui desde gestão de energia e sustentabilidade até serviços de Internet das Coisas (IoT) e Building Management Systems (BMS) para a gestão de espaços de trabalho flexíveis, impulsionada por avanços tecnológicos e mudanças legislativas, como a lei 13.429/2017, que liberalizou a terceirização para qualquer atividade. No contexto atual, onde empresas prestadoras de serviços de Facilities buscam constantemente eficiência e inovação, é crucial discutir as vantagens e desvantagens dessa expansão do core business, especialmente considerando o impacto estratégico e operacional para prestadores de serviços nesse setor em constante transformação. Este artigo visa explorar esses aspectos, fornecendo insights para altos executivos das empresas deste setor.
Expandir o Core Business: Crescimento pela Diversificação
A expansão, por muitas vezes, pode parecer o caminho mais natural, especialmente em um mercado pressionado por demandas tecnológicas e ambientais. Contudo, expandir não é apenas oferecer mais serviços. Trata-se de uma abordagem estratégica, de risco, que requer planejamento, inovação e maior maturidade na prestação dos serviços. A oferta de novos serviços em novos mercados é um dos movimentos estratégicos de crescimento de maior risco. Diversos aspectos, do técnico ao cultural, trazem complexidade ao movimento, mas também promovem grandes oportunidades.
Oportunidades de Crescimento com Expansão
Diversificação de Receitas: ampliar o portfólio de serviços, especialmente com soluções tecnológicas como manutenção preditiva ou serviços relacionados à sustentabilidade, pode abrir novas fontes de receita e reduzir a dependência de atividades tradicionais.
Maior Poder de Mercado: empresas que dominam diferentes frentes de serviço tendem a consolidar sua posição no mercado. Oferecer soluções completas — desde a manutenção básica até o gerenciamento sustentável de recursos — pode atrair grandes contratos e criar parcerias estratégicas de longo prazo.
Captação de Novos Clientes: muitos clientes procuram prestadores que possam ofertar soluções integradas. A ampliação de ofertas pode fazer com que sua empresa se torne um parceiro valioso para aqueles que buscam não apenas um serviço específico, mas um portfólio robusto e diversificado.
Desafios da Expansão
Entretanto, expandir é uma decisão que traz riscos, e a execução mal planejada pode ser fatal. A gestão da complexidade crescente é um dos maiores desafios.
Estrutura Financeira Sólida: investir em novas áreas exige capital significativo. O retorno pode demorar, e sua empresa deve estar preparada para absorver custos de entrada em novos mercados sem comprometer a estabilidade financeira.
Gestão de Operações Complexas: quanto mais diversificado for o portfólio, mais difícil será garantir a integração entre os serviços. Processos, sistemas e equipes precisam ser realinhados para que a operação flua de maneira eficaz. Qualquer falha na integração pode afetar diretamente a qualidade do serviço prestado, o que, por sua vez, pode impactar negativamente a imagem da empresa.
Decisão de Novos Mercados: tão importante quanto saber quais os novos mercados atacar, é priorizar estes segmentos, e principalmente decidir quais mercados “não atacar”, pelo menos em um primeiro momento, seja pela falta de especialização ou competências insuficientes para ingressar neste novo segmento.
Definição da proposta de valor e diferencial competitivo: a proposta de valor no setor de Facilities deve refletir a capacidade de oferecer serviços integrados, eficientes e inovadores, alinhados às demandas específicas dos clientes. O diferencial competitivo se constrói com base em especialização, uso de tecnologias avançadas, práticas sustentáveis e excelência operacional, garantindo parcerias de longo prazo e fortalecimento da posição no mercado.
Manter o Foco no Core Business: Crescimento pela Especialização
Se, por um lado, a expansão oferece grandes oportunidades, focar no core business também apresenta benefícios claros para as empresas que buscam liderança de mercado com base em especialização, como mostra a matéria citada no início deste artigo e os estudos de caso listados ao final deste artigo. Conforme destacado por Chris Zook em seu livro "Lucro a Partir do Core Business", as empresas que mantêm o foco em suas competências centrais conseguem gerar crescimento sustentável ao eliminar complexidades e maximizar a eficiência, garantindo um nível elevado de excelência e reduzindo a exposição a riscos.
Vantagens de um Foco Restrito
Especialização Profunda: empresas que se dedicam a um nicho específico conseguem desenvolver uma expertise inigualável. Tornar-se uma referência em um setor específico pode aumentar significativamente a competitividade da empresa, pois a qualidade de seus serviços será um diferencial estratégico.
Operações Mais Ágeis e Eficientes: com menos áreas para gerenciar, a empresa pode otimizar seus processos, eliminando ineficiências e garantindo operações mais ágeis. Isso também permite a introdução de inovações dentro da área de atuação, mantendo a competitividade.
Menor Exposição a Riscos Financeiros: concentrar-se no core business significa menores investimentos e estes podem ser direcionados de forma mais precisa, evitando o risco de falhas na diversificação e, ao mesmo tempo, maximizando o retorno sobre investimentos já estabelecidos.
Riscos do Foco Restrito
Manter-se em uma área limitada também apresenta desafios, especialmente se a empresa não investir continuamente em inovação.
Inovação Contínua no Core: mesmo com foco restrito, as demandas do mercado continuam a evoluir. Sem inovação constante, há o risco de estagnação. Tecnologias como inteligência artificial, automação e IoT são cruciais para manter a competitividade.
Adoção de Novas Práticas Operacionais: a eficiência operacional deve ser constantemente avaliada e aprimorada. Processos como a manutenção preditiva, impulsionados por dados, podem melhorar a qualidade e a eficiência dos serviços oferecidos.
O Desafio do Óbvio: Decidir e Executar com Perfeição
Se há algo que executivos não podem se dar ao luxo de fazer, é permanecerem indecisos ou implementar a estratégia de forma hesitante e pouco assertiva. No mercado de Facilities, a hesitação pode resultar na perda de oportunidades valiosas. Se sua empresa não estiver preparada para decidir — seja pela expansão ou pelo foco no core business —, corre o risco de ser superada por competidores mais ágeis e decididos.
Decidir com base na vocação, competências e potencial de mercado – O Conceito do Porco-espinho
Adotando o conceito do porco-espinho, do famoso livro Good to Great, de Jim Collins, empresas de Facilities podem clarificar suas decisões estratégicas. O foco deve estar em identificar o ponto de interseção entre o que a empresa tem como sua verdadeira paixão, onde pode ser muito melhor que seus concorrentes e o que impulsiona seu motor econômico.

Por exemplo, se uma empresa descobre que sua competência reside em oferecer soluções sustentáveis e integradas de gestão de espaços, ela deve focar intensamente nesse serviço, alavancando sua especialização para superar a concorrência e entregar valor excepcional aos clientes. Esta abordagem focada não apenas minimiza os riscos inerentes à expansão, mas também posiciona a empresa como líder em um nicho específico, tornando-a indispensável para seus clientes e mais resiliente a mudanças de mercado. A decisão final entre expansão ou foco deve, portanto, refletir uma análise profunda desses três círculos fundamentais, assegurando que a estratégia escolhida esteja alinhada com o verdadeiro propósito e potencial da empresa.
Decidir com Base em Dados e Tendências
O uso de ferramentas analíticas avançadas e o acompanhamento das tendências de mercado são essenciais para uma decisão informada. Executivos devem considerar fatores como mudanças tecnológicas, necessidades dos clientes e pressões regulatórias antes de tomar uma decisão final.
Como exemplo, a pressão por sustentabilidade e a demanda por soluções verdes estão se intensificando. Empresas que integram práticas sustentáveis em seu core business ou como parte de uma estratégia de expansão podem se destacar e agregar valor significativo aos seus clientes.
Conclusão: Preparação e Ação São as Chaves
Seja expandindo ou mantendo o foco no core business, o que define o sucesso é a capacidade de execução estratégica. Executivos no setor de Facilities precisam tomar decisões bem embasadas, alinhar suas equipes e implementar ações com confiança. O futuro pertence àqueles que escolhem um caminho e o seguem com determinação.
Então, o que será? Expansão ou foco? A escolha é sua, mas o que realmente importa é agir agora.
Estudos de Caso
1: Sucesso na Expansão
O Grupo GPS tem sido um exemplo notável de sucesso na expansão de seu core business no setor de Facilities no Brasil. Fundado em 1962, o grupo iniciou suas operações focado em serviços de limpeza e manutenção predial. Ao longo das décadas, adotou uma estratégia agressiva de aquisições e diversificação de serviços, ampliando seu portfólio para incluir segurança, logística, engenharia de utilidades, serviços industriais e alimentação. Essa abordagem permitiu ao Grupo GPS consolidar sua posição como líder nacional, atendendo a uma ampla gama de clientes em diversos setores.
Em 2024, o grupo concluiu a aquisição da GRSA, uma das principais empresas de catering e restaurantes corporativos do país, adicionando R$3,3 bilhões em receita bruta e fortalecendo sua presença no segmento de alimentação. Essa nova aquisição demonstra que o Grupo GPS segue firme em sua estratégia de expansão e será um interessante desafio para testar sua capacidade de integrar novos serviços e mercados, mantendo a excelência operacional e atendendo às crescentes demandas de seus clientes.
2: Insucesso na Expansão
Em contrapartida, a empresa Mitie, uma das principais fornecedoras de serviços de Facilities no Reino Unido, enfrentou dificuldades com sua estratégia de expansão. A empresa tentou diversificar agressivamente seu portfólio, entrando em setores como saúde e energia, sem o devido preparo financeiro e operacional. A falta de integração entre os novos serviços e as operações principais da empresa resultou em uma queda significativa na qualidade de seus serviços, o que impactou negativamente sua reputação. Além disso, a empresa sofreu com custos inesperados e uma estrutura de dívida insustentável. Como resultado, a Mitie enfrentou perdas financeiras significativas e precisou reestruturar suas operações, voltando a focar em seu core business tradicional para sobreviver.
3: Sucesso em se manter no Core
Fundada há 27 anos e especializada em segurança patrimonial, a Haganá Segurança é um exemplo de empresa que manteve um foco claro em seu serviço de segurança, sem se aventurar significativamente em outros serviços de Facilities. Sendo uma referência no setor, a empresa oferece soluções integradas que incluem segurança eletrônica, portaria, e escolta armada, focando em qualidade e eficiência, contando atualmente com mais de 6.000 funcionários.
4 Insucesso em se manter no Core
Uma rápida olhada nos sites de grandes prestadores de serviços de Facilities é suficiente para se ver os desafios enfrentados por empresas que tentaram manter o foco e competir com players nacionais e internacionais com soluções integradas, como foram os casos da Graber Segurança e da Algar Segurança, ambas adquiridas pelo Grupo GPS em 2017 e 2019, respectivamente. Mais recentemente, a GPS anunciou a aquisição do grupo GRSA, que oferece soluções de alimentação e serviços de suporte com um faturamento acima de R$3 bilhões anuais.


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